Quando ainda era jovem, acreditei, de forma ingênua, que diferentes correntes políticas brasileiras perseguissem os mesmos objetivos, ainda que por caminhos distintos. A realidade, porém, mostrou que os meios variam porque os fins são incomparáveis. Não se trata de uma questão de aparência; há diferenças profundas de intenção, coração e pensamento. Ao assumir o governo, a esquerda tem tratado qualquer crítica como um ataque pessoal. A oposição, hoje reduzida a poucos rostos reconhecíveis e a meia dúzia de canais digitais, é rotulada como uma ameaça perigosa, como se fosse uma falange de invasores atacando por todos os lados. Essa imagem de autocontenção e nobreza que se atribui à esquerda fora do poder não se sustenta quando se ouve o ex‑presidente Lula por alguns minutos: a falta de moderação e de bons modos fica evidente, tanto no discurso quanto na prática. Imagine um plenário ou um colegiado onde a maioria se situe entre a esquerda moderada e a extrema esquerda, formando um bloco tão sólido que pode agir como quiser. Quais são as chances de que, nesse cenário, não ocorram abusos de poder, supressão da minoria, distorção da realidade e alterações nas regras do jogo para atender interesses imediatos? Essa “maioria de ocasião”, expressão usada por Joaquim Barbosa para descrever o STF de sua época, parece estar se repetindo. No Supremo Tribunal Federal, independentemente de quem suceda Luís Roberto Barroso, os governos petistas permitiram ao PT consolidar um bloco composto por sete ministros indicados pelo partido e dois de origem tucana – resultado que muitos atribuem ao chamado Pacto de Princeton. A única dissensão aparente vem do ministro Fux e dos dois indicados pelo ex‑presidente Jair Bolsonaro. O que se tem observado, porém, é previsível: o tribunal assumiu um papel político ativo, criou justificativas excepcionais para ultrapassar limites institucionais e, de fato, instaurou uma “democracia de povo silencioso”, colocando o parlamento em um regime semiaberto, sujeito a medidas cautelares. Essas medidas cautelares têm origem no foro privilegiado, que coloca inúmeros congressistas sob a dependência do STF. A inclusão de parlamentares em inquéritos ou processos penais que tramitam – ou ficam parados – no tribunal, bem como a simples possibilidade de futuras investigações, gera uma cautela que, na prática, restringe direitos fundamentais da representação. Esse é um dos principais males que afetam nossa democracia. Em sociedades de massa, a representação é indispensável; quando ela é enfraquecida, reduzida ou manipulada, a política perde legitimidade, assim como a justiça se desqualifica ao ignorar denúncias ou perseguir quem as faz.