A viagem de Fábio Luís Lula da Silva, conhecido como Lulinha, a Portugal, em classe executiva, ao lado de um alto dirigente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), trouxe à tona mais um episódio que evidencia o fosso entre o discurso social do governo e as práticas adotadas por seus círculos mais próximos. Em um país onde aposentados e pensionistas aguardam, por vezes, meses ou até anos, por perícias, revisões e concessões de benefícios, a imagem de luxo no exterior gera indignação e levanta dúvidas inevitáveis.
O contraste não poderia ser mais evidente. De um lado, milhões de brasileiros enfrentam a burocracia, a morosidade do sistema e a pressão sobre o orçamento familiar. Do outro, o filho do presidente da República desfruta de conforto máximo, acompanhado por um dirigente de um dos órgãos mais sensíveis da administração pública, responsável por gerir bilhões de reais e diretamente ligado à sobrevivência de idosos e trabalhadores incapacitados. Essa cena não apenas surpreende, como reacende suspeitas antigas de acesso privilegiado, influência política e a naturalização de benefícios reservados a poucos.
Não se trata apenas de uma viagem internacional, mas do simbolismo que ela carrega. Qual foi o objetivo do deslocamento? Houve agenda oficial? Quem arcou com as despesas? Que tipo de interlocução se deu entre um familiar direto do presidente e um dirigente do INSS fora do país? O silêncio oficial até agora apenas amplia o desconforto e alimenta a percepção de que certas relações continuam acontecendo longe dos holofotes e sem a devida transparência.
Lulinha não ocupa cargo público, porém seu sobrenome e a proximidade com o poder tornam qualquer movimento politicamente relevante. Quando esse movimento ocorre ao lado de um representante do Estado, em circunstâncias de alto padrão, o episódio deixa de ser privado e passa a interessar diretamente à sociedade. Em uma democracia que se diz comprometida com igualdade e justiça social, o mínimo esperado é clareza absoluta.
Para o cidadão comum, a realidade permanece dura: filas intermináveis, aplicativos que falham, perícias canceladas e benefícios represados. Nesse cenário, a viagem em primeira classe deixa de ser um detalhe e se transforma em símbolo. Para alguns, o Brasil ainda oferece tapete vermelho, serviço premium e assento reclinável. Para a maioria, resta esperar, em silêncio, na sala de embarque do INSS.
